sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Pior presidio do país não faz revista íntima igual ao ABC


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014 11:16 [Nenhum Comentário] 
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Cintia Alves
Fundação Casa de Santo André abriga 300 menores. Foto: Pedro Diogo
Com o total de cinco unidades da Fundação Casa em Santo André, São Bernardo e Mauá, o ABC, por iniciativa de órgãos do Poder Judiciário, de conselhos municipais e movimentos ligados aos Direitos Humanos, decidiu batalhar para extinguir o que considera uma medida vexatória e desnecessária: revistas íntimas em adolescentes internos e visitantes.
Na semana passada, o tema foi debatido em audiência pública no centro de Santo André, que abriga mais de 300 jovens nos dois prédios da entidade implantada pelo governo do Estado. Segundo o defensor público Marcelo Carneiro Novaes, dados apontam que as revistas íntimas feitas para tentar detectar a entrada de objetos proibidos (como drogas ou armas) no equipamento público podem acontecer, em média, sete vezes por dia.
"No sistema da Fundação Casa do ABC, entre janeiro de 2012 e o primeiro semestre de 2013, cerca de 820 mil revistas foram realizadas nos internos e visitantes", pontuou. "No mesmo período, não houve nenhuma apreensão de objetivos proibidos. Ou seja, esse volume exagerado de revistas é desnecessário", completou.
Segundo o especialista, no sistema prisional de grande porte, a revista íntima só acontece em casos de deslocamentos externos dos detentos. "Na Fundação Casa, qualquer passagem interna requer revistas. É abusivo. O sujeito sai com a cabeça esfacelada por passar por tanto constrangimento. O pior presídio do País não faz revistas como no ABC", analisou.
As revistas são praticadas segundo definição do regimento interno da Fundação Casa. O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Santo André, que também encabeça a movimentação pelo fim do procedimento, coleta há anos queixas e denúncias de visitantes e internos que têm seus órgãos genitais expostos durante a fiscalização. Ao RD, a presidente do núcleo, Maria Inês da Costa, relatou um dos episódios que marcou sua atuação profissional.
"Eu atendi uma senhora de 68 anos, do Jardim Cristiane, que sofria de problemas de saúde, como obesidade. Ela mal conseguia se abaixar, mas passava pela revista para visitar o neto, hoje com 18 anos, já afastado da Fundação Casa. Ela dizia que não tinha nada mais vergonhoso do que passar por aquela situação", contou a assistente social.
Maria Inês e o defensor Novaes adotaram discurso uníssono quanto ao fim das vistorias. "Quanto aos adolescentes, a direção da Fundação Casa tem de tomar consciência e acabar com as revistas. Já para os visitantes, o certo é investir em tecnologia, como scanners utilizados em aeroportos. Isso porque há estudos que apontam que se a mulher quiser entrar com item introduzido na genitália, a revista não vai impedir. A revista só é parte de uma cultura de submissão do adolescente sentenciado e de suplício para a família que o visita", sustentou Novaes.
O grupo agora pretende expandir a discussão para as demais cidades do ABC que possuem unidade da Fundação Casa. Além disso, já enviaram carta de apoio e buscam assinaturas favoráveis a projeto que tramita no Congresso acerca de regulamentação das revistas íntimas. Na audiência, o deputado José Bittencourt (PSD), apresentou a minuta de projeto de lei (PL 797) para acabar com o procedimento. Já o deputado Adriano Diogo (PT) se comprometeu a convocar audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado.
O Consórcio Intermunicipal Grande ABC, que reúne os sete prefeitos da região, também deve ser acionado pelo movimento. "Achamos que o espaço para articular essas decisões é o Consórcio Intermunicipal, pelo peso que tem nas questões políticas. É o que digo sempre: o ABC tem de servir de laboratório para o resto do Estado. E nós já estamos saindo na frente com essa discussão sobre a Fundação Casa", frisou Novaes.
As visitas acontecem, oficialmente, nas tardes de sábado e domingo.
Até o fechamento desta edição, a Fundação Casa não se posicionou sobre o assunto.